Tabajara da Serra das Matas: Aldeia Rajado

A culminância das atividades presenciais na terra do povo Tabajara de Rajado, localizada no município de Monsenhor Tabosa, pelo projeto Território e Cultura Alimentar no Ceará, confluiu com o período dos festejos juninos e resultou num encontro expressivo e identitário na Escola Indígena Aba Katu. Foi um belo arraiá de São João, a festa da abundância, da colheita, do milho! Um alimento base no sustento de muitas famílias da comunidade.

O conselho local, COPOINTARA, em sinergia com a proposta metodológica da equipe da Associação Slow Food do Brasil presente em campo, mobilizou a aldeia para uma noite de celebração da cultura alimentar que marcou pela diversidade de expressões culturais e gustativas do sistema agrícola tradicional Tabajara. Cada família apresentou um prato, que compôs a fartura de mucunzás salgados, tapiocas, milho, batata doce, manzapes, caldos e bolos de macaxeira e de milho.

O engajamento da juventude e o envolvimento comunitário foram tangíveis, desde o card de divulgação convidando à participação da comunidade até a mesa composta por alimentos locais, oriundos da agricultura familiar e transformados em receitas saborosas, mantidas e preparadas, em sua maioria, pelas mulheres do Rajado. Teve ainda o Toré, o forró e a quadrilha que animaram a noite, comprovando a potência da atuação coletiva, intergeracional, do povo Tabajara. “Quando a gente fala num projeto desse, que nós estamos aqui tendo o privilégio de ser agraciados, nós estamos falando de vida”, conta a Cacique Toinha Tabajara, uma das principais lideranças indígenas da Serra das Matas, e acrescenta que “é um projeto muito rico, porque ele vem para resgatar uma cultura que está sendo esquecida”.

O momento festivo encerrou um ciclo de três etapas imersivas ao longo dos meses de abril, maio e junho. Na primeira, a equipe da ASFB realizou uma formação de inventariantes do patrimônio cultural alimentar e de comunicadores e comunicadoras populares indígenas. A intenção é que essas ferramentas sejam protagonizadas pela própria comunidade e auxiliem a construção de narrativas que valorizem a cultura alimentar e o território da Serra das Matas. Na sequência, foram realizadas vivências relacionadas aos temas destacados pelos grupos temáticos, que compõem a pesquisa do inventário: modos de cultivar, modos de pescar, caçar e criar animais, modos de curar, preparos culinários, casa de farinhas e troncos velhos. E por último, para finalização das dinâmicas presenciais, foi feita a revisão coletiva do conteúdo gerado na pesquisa participativa e validado entre diversas lideranças e representatividades da Aldeia Rajado, bem como foi elaborado coletivamente o “Plano de Salvaguarda do Povo Tabajara da Serra das Matas: Aldeia Rajado”.

As vivências no território geraram aprendizagem e troca de conhecimentos, mapeando etnovariedades de alimentos e animais, receitas e medicinas. Momentos ricos de construção coletiva de saberes e de história, na medida em que mestras e mestres da cultura alimentar eram consultados pelas juventudes para entrevistas e captação de imagens, resultando em debates gravados em áudio, vídeos e texto, tanto pela equipe de educadoras e de audiovisual do projeto quanto pelo grupo de comunicação popular indígena, constituído durante os encontros formativos.

“Dentro desse inventário, acho que vocês puderam perceber, que nós temos agricultura. Nós temos agricultura tradicional, nós temos uma alimentação ainda saudável,
nós temos a cura, que a cura ela vem pela alimentação”.
Cacique Toinha Tabajara

Através das imersões e da aplicação das metodologias também é possível realizar rodas de conversa sobre diversos temas emergentes nas aldeias, como a alimentação saudável e nutricídio, mulheres, projetos culturais, sucessão rural, acesso a mercados diferenciados para comercialização de produtos da biodiversidade e a políticas públicas de soberania alimentar, a exemplo do PAA Indígena.

A metodologia dos Inventários Participativos da Cultura Alimentar do Slow Food se inspira na abordagem da Política Nacional de Patrimônio Imaterial, operada pelo IPHAN, unindo as experiências em educação alimentar e nutricional e do gosto da rede Slow Food Brasil. Em sintonia com o momento celebrativo, o primeiro trabalho de inventariamento participativo produzido pela ASFB com povos indígenas do Ceará foi contemplado pelo Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade, o mais importante da área do patrimônio cultural brasileiro, partilhado com o povo indígena Tremembé da Barra do Mundaú e Tabajara do Sertão dos Inhamuns.

Que seja só o começo de uma longa parceria!“, celebra a coordenadora do projeto TCACE, Lígia Meneguello, que também é coordenadora de Programas e Conteúdos da ASFB Associação Slow Food do Brasil, pelas confluências com a Aldeia Rajado e o Estado do Ceará.

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O projeto “Território e Cultura Alimentar no Ceará” é uma correalização da ASFB em parceria com a SDA/CE Secretaria de Desenvolvimento Agrário do Estado do Ceará, através do Projeto São José, com previsão de ações entre 2023-2025.

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