Metodologias participativas movimentam a juventude indígena e culmina na 1ª Festa do Jerimum

As ferramentas do projeto Território e Cultura Alimentar no Ceará têm se mostrado relevantes no suporte à valorização e à conservação dos saberes e práticas culturais de povos indígenas. Durante os meses de atuação junto ao povo Tabajara da Serra das Matas, de Tamboril, para realização dos percursos formativos de inventariantes culturais e comunicadores populares, a equipe da Associação Slow Food do Brasil teve a oportunidade de vivenciar a Aldeia São Manoel, conhecer lugares sagrados no território e aprender com as histórias e os costumes das pessoas que convivem e são guardiãs dessa Terra.

A Chapada, como é chamada a parte alta do território, subindo a ladeira logo depois da casa de farinha, onde fica grande parte das roças de mandioca, entre cactos, mamonas, mucunas e uma imensa barriguda toda enfeitada de flores brancas, foi o cenário escolhido para a vivência da roda de Toré. “Grande estrondo deu na aldeia, que a aldeia balanceou”, cantaram professores e estudantes da Escola Indígena Alto da Catingueira. Conhecimentos tradicionais que foram se revelando vivos e genuínos na realidade das diferentes gerações.

A partir do comprometimento da comunidade escolar, foi possível realizar o levantamento do conteúdo para o Inventário Participativo da Cultura Alimentar Tabajara de Tamboril e também para o Plano de Salvaguarda. Além disso, foi gerado um importante acervo audiovisual com registros de depoimentos e demonstrações dos modos de fazer próprios do lugar. A casa de farinha, os modos de curar, de criar animais e de cultivar as ervas, raízes e grãos. As receitas de comidas e os preparos das medicinas tradicionais. Sabedorias ancestrais trazidas e compartilhadas pelos mais velhos e mais velhas, como D. Nia, que é irmã da Cacique Toinha Tabajara, e referência por suas produções da horta à mesa, do cheiro verde às polpas de frutas, bolos, mingaus, óleos e lambedores.

Ao documentar o uso de alimentos nativos, as técnicas de preparo e os significados culturais de cada prato, a iniciativa contribui para que esses conhecimentos permaneçam vivos, resistindo à homogeneização cultural e ao tempo”, destaca Lígia Meneguello, coordenadora do projeto. Para Emanoela Tabajara, educadora e liderança do povo Tabajara de Tamboril, a construção e partilha das histórias e memórias acende a chama pela existência e resistência indígena, “sempre buscando refletir aonde nós queremos chegar”. “Nós queremos buscar sempre melhorias e uma vida digna para o nosso povo. Tentando manter viva [a nossa cultura] e preservando os nossos traços culturais”, afirma Emanoela.

Retomada das celebrações na Aldeia São Manoel
A Festa do Jerimum celebra a fartura do sertão e a cultura alimentar do povo Tabajara da Serra das Matas. Realizar a primeira edição confluiu com o ponto alto das ações junto à comunidade de São Manoel. “A festa foi toda planejada e executada como uma metodologia do projeto. A melhor ação de salvaguarda que se pode ter da cultura alimentar são os festejos”, afirma a historiadora Gabriella Pieroni, uma das facilitadoras da equipe Slow Food engajadas na concepção do evento. A celebração foi uma reafirmação da identidade cultural do povo Tabajara de Tamboril, e também do povo Tabajara localizado no município de Monsenhor Tabosa, na Aldeia Rajado, ambos sob a liderança de D. Toinha.

Quem esteve no festejo pôde apreciar alguns dos sabores que foram destacados no processo de inventariamento. Além do jerimum, receitas das casas de farinha, como a macaxeira frita, o biscoito e a farofa. Comidas feitas com coentro, cebolinha, milho, feijão e carne de porco. Teve também os sucos de frutas da estação, como maracujá e acerola. Mesas de alimentos bons, limpos e justos que nutriram os laços comunitários e fortaleceram as parcerias para os avanços nas pautas prioritárias do território e de outros povos indígenas do estado.

O momento contou com a participação de representantes da Secretaria de Desenvolvimento Agrário e da Secretaria dos Povos Indígenas do Ceará, com destaque para a presença da 1ª Secretária de Estado, a Cacika Irê do Povo Jenipapo-Kanindé, Juliana Alves, além de comunicadores e outras representatividades da região. A ASFB compôs espaços importantes no evento, ocupando um lugar na mesa da cerimônia de abertura e na área para expositores, onde foi possível representar o movimento de forma interativa, contextualizando as ações da rede caracol brasileira através de livros e dinâmicas que atraíram a atenção, principalmente, de jovens e crianças. Logo ao lado da barraca do Slow Food, estava a do São Manoel Futebol Clube, time fundado pelo marido da D.Nia e pai da Emanoela, o encantado “Nêgo Paulo”, agricultor familiar e grande incentivador do esporte na comunidade. Uma homenagem que marca a retomada da participação do São Manoel em jogos oficiais do campeonato tamborilense. E a celebração do jerimum, o início de um novo ciclo próspero para a comunidade indígena de Tamboril.

O projeto “Território e Cultura Alimentar no Ceará” é uma correalização da ASFB em parceria com a Secretaria de Desenvolvimento Agrário do Estado do Ceará SDA/CE, através do Projeto São José.

CRÉDITO IMAGEM: Acervo Povo Tabajara da Aldeia São Manoel / Projeto TCACE 2024

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