Foto: Reunião na Terra Indígena Katukina-Kaxinawá em Cruzeiro do Sul, Acre, sobre o edital da alimentação escolar para povos e comunidades tradicionais.
O projeto Sociobiodiversidade Amazônica da Associação Slow Food do Brasil (ASFB) tem sido realizado nos estados do Amazonas, Acre e Pará. No Acre, atuamos em conjunto com diversas instituições na Comissão de Alimentos Tradicionais dos Povos do Acre (Catrapoacre) para o desenvolvimento do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) para povos indígenas e comunidades tradicionais.
A Comissão de Alimentos Tradicionais dos Povos do Acre (Catrapoacre) envolve diversas instituições governamentais, como a Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Esportes (SEE), que coordena a Catrapoacre, a EMATER, a Secretaria de Estado de Produção e Agronegócio (SEPA), a Fundação Nacional do Índio (Funai), a Embrapa e instituições não-governamentais, como a Organização dos Professores Indígenas do Acre (OPIAC), a Câmara Estadual de Comercialização da Sociobiodiversidade, Agroecologia e Produção Familiar no Acre, a Cooperação Técnica Alemã (GIZ), a Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre (AMAAIAC), a Comissão Pró-Índio do Acre (CPI/AC) e a Associação Slow Food do Brasil (ASFB).
O desenvolvimento do PNAE para as populações indígenas e extrativistas do Acre tem como base a Nota Técnica nº 03/2020, da 6º Câmara de Coordenação e Revisão – Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais do Ministério Público Federal (MPF) e da experiência no estado do Amazonas. Esta nota facilita o fornecimento das produções agrícolas (tanto vegetal quanto animal) dos(as) produtores(as) tradicionais aos editais de compras públicas da alimentação escolar. Com este embasamento, a produção vegetal processada, como a produção de vinho de açaí, bacaba e buriti, e de sucos diversos, assim como a produção animal (peixes, galinhas, ovos, suínos, caprinos) fica dispensada do aval da vigilância sanitária. Essa dispensa é dada pelo caráter familiar deste beneficiamento, pois, de uma maneira geral, os(as) moradores(as) de uma comunidade tradicional possuem relação parental. Deste modo, o MPF recomendou aos estados e municípios que possuem escolas em comunidades tradicionais, que criem editais específicos para a alimentação escolar.
Para aprofundar a compreensão deste contexto legal, recomendamos:
Guia Prático Alimentação escolar indígenas e de comunidades tradicionais
Animação – Alimentação escolar para povos e comunidades tradicionais
Para garantir que a alimentação escolar indígena e de comunidades tradicionais possa contemplar a riqueza da cultura destes povos, as diversas instituições que compõem a Catrapoacre têm se esforçado para o lançamento de um edital de chamada pública pela Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Esportes (SEE). Com o edital publicado, os produtores e produtoras poderão fornecer suas produções agrícolas para as escolas públicas de suas comunidades, uma vez que se inscrevam na chamada pública e assinem o contrato com a SEE.
Nesse sentido, estivemos presentes no mês de agosto em algumas atividades presenciais da Catrapoacre: a reunião presencial da Comissão e a oficina sobre o PNAE para comunidades tradicionais e indígenas na Reserva Extrativista (Resex) Cazumbá-Iracema, que fica em Sena Madureira. A reunião presencial buscou discutir pontos importantes do lançamento desta chamada especial da alimentação escolar e aprofundar a pauta com diversos servidores públicos da SEE. A oficina na Resex Cazumbá-Iracema reuniu extrativistas e os Jaminawas, que vivem na Terra Indígena do Rio Caeté, a qual é vizinha da Resex, assim como instituições vinculadas a Catrapoacre e do município de Sena Madureira.
Esta oficina teve o objetivo de divulgar a política pública de alimentação escolar para estas comunidades tradicionais, apresentar o passo a passo para se inscrever no edital e demonstrar o processo de execução da mesma. Dessa maneira, debatemos sobre as burocracias inerentes ao processo, o que é visto como um grande desafio por extrativistas e indígenas. Outro ponto importante da oficina é estimular a prefeitura de Sena Madureira a adquirir produtos destas comunidades para escolas municipais, tendo em vista que a atual proposta é para as escolas estaduais. Com isso, amplia o número de estudantes a serem atendidos por meio dessa política pública, com alimentação escolar de qualidade e adequada aos seus hábitos alimentares, além de contribuir com aumento da renda de agricultores e agricultoras.
Também aproveitamos a ida ao Acre para ir à Cruzeiro do Sul, no oeste do estado do Acre e banhada pelo icônico rio Juruá. Por lá, tivemos reuniões com o Marcos Nukini, do povo Nukini da cidade de Mâncio Lima, e encontros com os Katukinás e Puyanawas em suas terras indígenas. Estas reuniões tiveram o propósito de debater o lançamento do edital da alimentação escolar, as oportunidades de produtores e produtoras fornecerem suas produções diretamente para as escolas e o impacto positivo gerado na alimentação das crianças e seu aprendizado escolar.
Este edital da alimentação escolar indígena e de comunidades tradicionais deve ser lançado até o final de novembro para que as entregas aconteçam a partir de 2023. Dessa maneira, esperamos que esta política pública constitua uma ferramenta importante para o desenvolvimento territorial desses povos do Acre e uma garantia da segurança alimentar e nutricional desses povos. Há diversos possíveis outros benefícios que podem emergir dessa iniciativa, como o aumento da produção agrícola tradicional e sustentável, da organização social destas comunidades e do aprendizado escolar. Que mais iniciativas como essa possam se espalhar para o Brasil e ocupar todas as terras indígenas, reservas extrativistas, quilombolas e demais territórios tradicionais!
A Associação Slow Food do Brasil estabeleceu uma parceria para o desenvolvimento do projeto Sociobiodiversidade Amazônica com o projeto Bioeconomia e Cadeias de Valor, desenvolvido no âmbito da Cooperação Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável, por meio da parceria entre o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e a Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ) GmbH, com apoio do Ministério Federal da Cooperação Econômica e do Desenvolvimento (BMZ) da Alemanha. Este projeto está acontecendo nos estados do Amazonas, Acre e Pará ao longo de 2022 e 2023.