O Monte Ararat ergue-se no horizonte, coberto por um manto de nuvens; Ruslan Torosyan, líder do convivium Slow Food Ararat, olha para o monte, sorrindo: “Foi lá em cima que a arca de Noé encalhou depois do dilúvio universal. Está escrito no livro do Gênese e também nas Viagens de Marco Polo. Todo ano, dezenas de expedições saem à procura dos restos da mítica arca”.
Com seus 5.165 metros de altura, o Monte Ararat, em solo turco, domina o panorama da capital da Armênia, Yerevan. O seu perfil aparece também no brasão nacional, onde uma águia e um leão – símbolo das antigas famílias reinantes – seguram um escudo com a Arca em cima do Monte.
Na Armênia, nas encostas do Monte Ararat, o Slow Food celebra uma conquista importante. Nesta pequena região, com uma história tão importante, o projeto da Arca do Gosto festeja o embarque de seu milésimo passageiro.
Nascida em 1996, durante o primeiro Salone del Gusto de Turim, a Arca do Gosto é um catálogo internacional que descreve produtos alimentares, raças e variedades que correm o risco de desaparecer, levando consigo as tradições e os saberes aos quais estão indissoluvelmente ligados.
As indicações foram chegando, pouco a pouco, do mundo inteiro: da Bolívia à Austrália, centenas de pessoas sensíveis ao tema, com interesse na rede associativa, enviaram à Fundação Slow Food para a Biodiversidade formulários para a indicação de produtos. Foi assim aumentando, de ano a ano, a lista de tipos de mel, hortaliças, frios cada vez mais raros, cujo risco de extinção real ou potencial pode prejudicar todo um patrimônio econômico, social e cultural.
Até hoje, a Arca recolheu passageiros em 60 países diferentes: dos Estados Unidos, com o bisão das grandes planícies americanas, ao Brasil com o maracujá da Caatinga. As indicações são analisadas por uma comissão internacional e aproximadamente vinte comissões nacionais compostas por voluntários ligados, por profissão, aos temas do projeto (jornalistas, botânicos, veterinários, escritores, etc.). Se a indicação tiver os requisitos necessários, a inscrição no catálogo da Arca representa uma primeira forma de promoção e é muitas vezes uma primeira etapa rumo à realização de projetos mais complexos como o projeto das Fortalezas.
Ruslan, que é agrônomo, mostra sorrindo o passageiro da Arca número mil. “Os primeiros resquícios do damasco na Armênia” – diz abrindo a mão – “datam de 3000 anos e existem dezenas de variedades autóctones”. O damasco Shalakh que Ruslan mostra com orgulho é muito grande, macio, doce e saboroso; o fruto pode chegar a pesar até 100 gramas e é usado em muitas preparações tradicionais, como a geleia, que aqui se chama maraba. A variedade Shalakh cresce no vale do Ararat, perto de Yeravan: geralmente cada casa tem algumas árvores em seu jardim para consumo familiar. Mas o mercado internacional está hoje invadido por híbridos mais produtivos e que têm o mesmo nome, mas o verdadeiro damasco Shalakh corre o risco de desaparecer.
Com a entrada da variedade na Arca, o Slow Food Ararat espera salvar pelo menos uma parte das ricas tradições locais. A preservação da biodiversidade será um dos temas centrais do Terra Madre Armênia, cuja primeira edição será no dia 6 de agosto.
Cerca de sessenta delegados se reunirão na sede da Universidade de Agronomia de Yerevan, onde os temas abordados serão: cadeia produtiva curta, educação do gosto e da Arca do Gosto que, depois de ter recolhido aqui seu milésimo passageiro, sai de novo à procura de novos produtos a serem preservados.
Saiba mais:
Arca do Gosto
www.slowfoodfoundation.com
Produtos do Brasil na Arca do Gosto
www.slowfoodbrasil.com/content/category/6/19/69/
Damasco Shalakh
www.slowfoodfoundation.org
Terra Madre Armenia
www.terramadre.org