Com uma série de reuniões previstas para dois dias em São Paulo, embarquei para lá com a imagem da cidade que todos têm: muito trânsito, céu cinza, muitos prédios. E aquela pergunta: como as pessoas conseguem viver lá?
Por causa do objetivo da viagem, preparei os sentidos para avaliar com outros olhos, sem preconceitos. Já estive na cidade inúmeras vezes, desde a infância até a idade adulta, mas antes para passar férias e depois em viagens de negócios, muito rápidas e querendo voltar logo para casa. Porém, cometi um erro primário: esqueci a máquina fotográfica.
Guiada por Cenia Salles, líder do Convivium Slow Food de São Paulo, a programação incluiu, além das reuniões, encontros com pessoas muito interessantes, que de uma forma ou de outra estão ligadas pela ecogastronomia.
A primeira reunião foi na sede da Gastromotiva, organização com idéias e ações muito inovadoras. Enquanto a equipe, liderada pelo Chef David Hertz, preparava um jantar para 50 pessoas na cozinha, numa tranqüilidade impressionante, nós conversávamos sobre formas de fortalecimento do movimento Slow Food no Brasil e a possibilidade de realização de um grande evento na cidade.
Antes da reunião passamos pelo Espaço Zym, e conheci a Chef Claudia Matos e parte da sua equipe. Que lugar fantástico e que comida deliciosa. Dentre outras coisas, degustamos várias delícias preparadas com a banana e seus derivados (umbigo de bananeira, casca de banana, biomassa de banana), como entradas, pão, a sobremesa.E depois da reunião, muita conversa e uma passada rápida no Pão, Padaria Artesanal Orgânica. Que surpresa boa!
Mais conversas, idéias fervilhando, e mais tarde um jantar delicioso no Julia Gastronomia, da Chef Anayde Lima. O cuidado da Chef na escolha das matérias primas se refletem em uma mistura muito equilibrada de requinte, sofisticação e simplicidade, e o uso de produtos de excelente qualidade que tem nome e endereço. Sem falar na simpatia, na possibilidade de conhecer também a Chef Mônica Panetta e ouvir histórias deliciosas (algumas hilárias) sobre a experiência delas no Salone Del Gusto e Terra Madre 2008.
No dia seguinte, depois de uma longa reunião no estilo tradicional, um confortante almoço no Restaurante Tordesilhas. Na hora da sobremesa, que no meu caso foi cocada de tacho com sorvete de tapioca e molho de tamarindo, tivemos a companhia da Chef Mara Salles, idealizadora do lugar. Não foi surpresa, mas muito bom ouvir que, dentre as colaborações que ela estabelece com pequenos produtores de alimentos de qualidade, está a Coopercuc e a Fortaleza do Umbu.
No sábado uma visita às feiras do Parque da Água Branca, a dos Agricultores Orgânicos e a dos Agricultores Biodinâmicos, e um café da manhã em baixo das árvores. Que diversidade de produtos e pessoas. Para quem mora em São Paulo, dá para comprar tudo por lá e deixar de lado as visitas aos supermercados tranquilamente.
Lógico que, trabalhando e respirando ecogastronomia todos os dias, em São Paulo não seria diferente. Mas confesso que eu não tinha a mínima noção que uma cidade tão grande e acelerada poderia oferecer estes prazeres, e gente tão comprometida com o "bom, limpo e justo" . Tenho certeza que só toquei na superfície da realidade ecogastronômica da cidade. Senti falta de encontrar algumas pessoas, principalmente a Neide Rigo . Seriam necessárias muitas viagens destas ou uma longa estadia para ter noção do que a cidade pode oferecer, mas acho que não faltarão oportunidades.
Roberta Sá é cientista de alimentos e coordenadora dos projetos do Slow Food no Brasil. Quando é possível, escreve no blog Alimento para Pensar .