Texto originalmente publicado no site da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida
Conforme a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, o Brasil é o país que mais gasta com agrotóxicos no mundo. As culturas de soja, milho e cana-de-açúcar representam 76% de toda a área plantada do Brasil, sendo as que mais consumiram agrotóxicos, correspondendo a 82% de todo o consumo do país em 2015. O maior volume de agrotóxicos utilizados no país destina-se a quatro culturas majoritariamente exportadas. Assim, o uso intensivo de agrotóxicos é direcionado para a produção de commodities, não de alimentos.
Segundo os dados do IBGE (Censo agropecuário 2017), cerca de 70% dos estabelecimentos possuem área entre 1 e 50 hectares e tem como base a agricultura familiar, grupo este com baixa despesa no custo de produção com agrotóxicos (somente 4% do custo de produção). Alimentos essenciais para a vida da população brasileira devem ter benefícios fiscais, não os agrotóxicos.
A devida tributação dos agrotóxicos impactará quase que de forma insignificante na produção de alimentos no país e no repasse ao consumidor. Impactará grandes proprietários rurais que destinam a produção para exportação e que já são beneficiados por outros incentivos e benefícios no sistema tributário nacional, como é o caso das desonerações para exportações e do financiamento por bancos públicos.
Mais do que isso, o Tribunal de Contas da União, no Relatório de Auditoria 028.938/2016-0, afirmou que “ao reduzir o preço dos agrotóxicos por meio de renúncia tributária para a importação, a produção e a comercialização interestadual de defensivos químicos, o governo brasileiro incentiva o uso de agrotóxicos e atua de forma contraditória e contraproducente aos objetivos das políticas que buscam garantir sistemas sustentáveis de produção de alimentos”.
Já no plano internacional, os relatores de Direito à Alimentação Adequada e de resíduos Tóxicos da Organização das Nações Unidas (ONU) recomendaram ao Brasil “que haja a eliminação de subsídios aos pesticidas e o pagamento de taxas por sua utilização” (Recomendação “r” do Relatório A/HRC/34/48).
Relatório publicado por pesquisadores da ABRASCO indica que somando todas as desonerações fiscais sobre agrotóxicos no país, o Estado brasileiro perde R$ 10 bilhões de reais por ano, dos quais 63% referem-se ao ICMS. A renúncia fiscal apenas do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) no Rio Grande do Sul daria para cobrir mais da metade do déficit orçamentário do estado em 2017. Já no Mato Grosso, esse valor representa 66% de todo o orçamento da saúde estadual.
De outro lado, estima-se que somente para tratamentos de saúde decorrentes de intoxicações agudas por agroquímicos, o estado do Paraná gasta US$ 1,28 para cada US$ 1 utilizado na compra de agrotóxicos, conforme artigo publicado por pesquisadores da Fiocruz.
Assim, a renúncia de arrecadação com os agrotóxicos é no mínimo paradoxal, considerando que o país vive uma crise financeira e que, sob efeitos da Emenda Constitucional nº 95/2016, em 2019 houve um encolhimento de R$ 20,19 bilhões nos recursos saúde da população, de acordo com o Conselho Nacional de Saúde. Sobretudo em momento de colapso do SUS pela propagação da pandemia de Covid-19, é um contrassenso que o país permaneça estimulando, via benesses fiscais, o uso de produtos tóxicos que acarretam em internações por intoxicações crônicas ou agudas.
Quem pagará a conta quando a população buscar atendimento nos serviços de saúde em decorrência da exposição aos agrotóxicos, a exemplo das intoxicações agudas e das doenças crônicas como cânceres, disfunções endócrinas e genéticas? Ressaltando que, além dos impactos à saúde, há ainda os danos ambientais, como a perda da biodiversidade, extermínio de insetos polinizadores e o prejuízo privado de inúmeros agricultores que têm suas plantações e cultivos contaminados com agrotóxicos disseminados pelo ar, pelo solo e pela água.
Assim, considerando:
Que as Cláusulas 1ª e 3ª do Convênio nº 100/97 do Conselho Nacional de Política Fazendária que reduzem 60% da base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) sobre os agrotóxicos e autorizam a ampliação de isenções de alíquotas em até 100% pelos estados;
Que, ao concederem isenção ou redução sobre a tributação aos agrotóxicos, por serem identificados como produtos essenciais, apesar de serem cientificamente e comprovadamente danosos à saúde e ao meio ambiente, essa decisão privilegia determinados grupos econômicos e produtivos do país, com um altíssimo custo à coletividade e à população brasileira, ao patrimônio e ao erário público, adotando uma seletividade, que é mecanismo de manutenção da desigualdade;
Os princípios basilares do direito ambiental na tratativa séria dos benefícios fiscais aos agrotóxicos, em especial o respeito aos princípios da responsabilidade e solidariedade intergeracional, da precaução e do poluidor-pagador;
Os princípios constitucionais e direitos fundamentais, especialmente o Direito Fundamental ao Meio Ambiente Equilibrado (art. 225 da Constituição Federal); ao Direito Fundamental à Saúde (art. 196 da CF; ao Direito Fundamental à alimentação adequada e a Segurança Alimentar e Nutricional (art. 6º da CF) e aos Princípios da Seletividade e da Essencialidade Tributária (art.153, §3º, inciso I e art. 155, § 2º, inciso III da CF);
Que investir na alimentação é investir na vida, no desenvolvimento social do país e que é preciso maior incentivo e políticas públicas para a agricultura orgânica e agroecológica que produz alimentos saudáveis para a população,
Solicita-se, que na próxima reunião do Confaz, não sejam renovados benefícios fiscais de redução ou isenção de impostos aos agrotóxicos, dispostas nas Cláusulas 1ª e 3ª no Convênio nº 100/97.
Assinam esta carta, a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida e organizações abaixo:
- 342Amazonia
- A Cozinha Performatica
- Alternativas para Pequena Agricultura no Tocantins
- Amigos da Terra Brasil
- Aneps RJ
- Aopa Associação para o desenvolvimento da agroecologia
- Aproagro
- Articulação no Semiárido Brasileiro – ASA
- Asibama Acre
- ASSOCIAÇÃO Agroecológica Quintal Verde
- Associação agropastoril de pequeno produtor
- Associacao Bem Te Vi
- Associação de Biodinâmica do Sul (ABD SUL)
- Associação Brasileira de Agricultura Biodinâmica (ABD)
- Associação Brasileira de Agroecologia
- Associação Brasileira de Saúde Coletiva – ABRASCO
- Associação Brasileira dos Terapeutas Ocupacionais – ABRATO
- Associação Cultural Catavento de Ideais
- Associação de Geógrafos Brasileiros – Seção Local Aracaju
- Associação dos Protetores Ambientais-A.P.A
- Assolib
- Autonomia ZN
- Casa dos Padres
- Cast Tecnologia e Arte
- CAUS (Conexão Agroecológica Urbana Social)
- Cdecma
- CDHDMB
- Central Única dos Trabalhadores – CUT
- Centro Acadêmico de Agroecologia – Urucum: Construção e Resistência
- Centro de Agricultura Alternativa Vicente Nica
- Centro de Assessoria e Apoio aos Trabalhadores e Instituições Não Governamentais Alternativas
- Centro de Desenvolvimento Agroecológico Sabiá – Centro Sabiá
- Centro de Estudos do Trabalho e de Assessoria ao Trabalhador – CETRA
- Centro de Tecnologia Altrenativas Populares
- Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata CTA-ZM
- Centro Dom José Brandão de Castro – CDJBC
- Centro Nordestino de Medicina Popular-CNMP
- Coeqto
- Coletiva TarakTagu
- Coletivo de Assistentes Sociais Resistência e Luta
- Coletivo Praia Limpa
- Coletivo Saúde da Roça
- Comsea-conselho de segurança alimentar de Cafelândia-me.
- Comunidade da Inovação
- ComVida
- Conceito Prime
- Conexão Samambaia – Programa de Residências Transestéticas
- Consea Paraná
- Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional do Ceará
- Conselho Indigenista Missionário regional Goiás /Tocantins
- Coopage e cozinha colher de pau
- COOPANENA
- Coordenadoria Ecumênica de Serviço – CESE
- coresan –maringá
- CRED1
- Do Quintal Prá Mesa
- EcoBlum
- ECOFAM – Associação de agroecologia familiar
- ECOOTOPIA – Associação Cooperativa de Idéias e Soluções para o EcoDesenvolvimento
- FEDERAÇÃO dos Trabalhadores Rurais agricultores e agricultoras familiares de Pernambuco
- Fetagri-RJ
- Floresta Viva
- Fórum Baiano de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos, Transgênicos e Pela Agroecologia
- Fórum Magé Cidadania
- Fórum Mato-grossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento
- Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor
- Forum Nacional de combate aos Impactos dos Agrotoxicos e Transgênicos
- FORUM PARANAENSE DE COMBATE AOS AGROTOXICOS
- Fórum Permanente de Defesa do Consumidor do Estado do Ceará
- Fórum Regional (Maringá) de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos
- Fórum regional de combate aos agrotóxicos de Maringá e região
- Fundação de Apoio ao Desenvolvimento Sustentável e Solidário da Região Sisaleira
- Grupo de Pesquisa Costeiros – UFBA
- Grupo de Pesquisa GeogrfAR (UFBA)
- Grupo Semente
- GT de Agrotóxicos da FIOCRUZ
- Indaiá Orgânicos
- Instituto Caracol
- Instituto de Defesa do Consumidor – IDEC
- Instituto Dom Alberto Guimarães Rezende
- Instituto Harpia Harpya
- Instituto MIRA-SERRA
- Instituto Terraviva
- Instituto Uruçu
- M.J.N.C.Gomes
- Mandato Deputado Estadual Goura – Paraná
- MARCHA mundial das mulheres SC
- Meio Hectare Produção Orgânica
- Mmtl
- Movimento de Mulheres Camponesas – MMC
- Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA
- Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST
- Movimento pela Soberania Popular na Mineração – MAM
- Movimento Urbano de Agroecologia MUDA
- NEAST
- Núcleo de Ecojornalistas do RS
- Núcleo de Estudos em agroecologia e produção orgânica Unipampa
- OCA
- Oeko Br
- OPTAR ORGÂNICOS
- Organic4 Alimentos Ltda ME
- Patrimônio do Carmo
- Produçoes Cinematográficas L. C. Barreto Ltda
- PROJETO GUERREIROS DOS OCEANOS
- Raízes do Semiárido
- Rede Agroecológica de Prosumidores Raízes da Mata
- Rede Curitiba Climática
- Rede de Agroecologia do Maranhão-RAMA
- Rede Ecológica Rio
- REDE MUTUM – Articulação Alagoana de Agroecologia
- Rede Sergipana de Agroecologia (ReSeA)
- RUCA ES
- Sabores de UR. Cozinha renegrativa
- Sapiência ambiental
- SINPAF – Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário
- Slow Food Brasil
- SOCIEDADE AMIGOS DO ITIQUIRA – SAC
- Subverta
- Terra de Direitos
- Todo Ciclo
- Toxisphera Associação de Saúde Ambiental
- União Brasileira de Mulheres/Sergipe
- UNITERRA