No Brasil, a macaúba (Acrocomia aculeata) é também denominada bocaiúva, chiclete-de-baiano, coco baboso, coco de catarro, coco de espinho, macacauba, macaiba, macaibeira, macaúba, mucaia, mucajá e mucajaba.
Ela é uma palmeira perene, frutífera, nativa de florestas tropicais, com ampla distribuição geográfica, com ocorrência desde o sul do México até ao sul do Brasil, Paraguai e Argentina. Dentre as palmeiras nativas é considerada a de maior disseminação no território brasileiro. A macaúba é amplamente distribuída em áreas do cerrado localizadas nos estados de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Embora a presença da macaúba seja verificada em quase todas as regiões do território brasileiro, os povoamentos naturais mais densos da palmeira localizam-se notadamente nas áreas menos colonizadas. Em Minas Gerais se verificam grandes concentrações da macaúba, cuja população distribui-se predominantemente em três microrregiões do estado – Abaeté, Jaboticatubas e Brasília de Minas.
Macaúba. Foto: DoDesign-s
Possui forte potencial de uso do estipe, das folhas e dos frutos. Existem relatos de utilização do coco da macaúba proveniente da coleta extrativista das populações naturais desde a pré-história, há cerca de 9.000 anos. Ainda hoje, todo coco de macaúba utilizado é oriundo do extrativismo de plantas ou populações naturais. A exploração de produtos florestais é uma alternativa valiosa para as populações rurais que tradicionalmente dependem deles para a subsistência. Posicionada no grupo de espécies que apresentam altos rendimentos de óleo por hectare, sendo a produção de óleo, portanto, a principal utilidade econômica do coco macaúba
Óleo de coco macaúba comercializado na feira Raízes do Campo, em Jaboticatubas/MG. Fonte: Raízes do Campo
O óleo de macaúba é produzido a partir do beneficiamento das castanhas (parte interna do fruto que inclui o mesocarpo e o endosperma) da palmeira homônima, mediante torra e cozimento, seguido de extração por decantação e purificação.
De acordo com os estudos de De Oliveira (2014), intitulado Saberes locais associados ao extrativismo da Macaúba na Feira Agroecológica Raízes do Campo e em quintais de Jaboticatubas, Minas Gerais, “a produção do óleo da gema começa com a quebra do coco na pedra com uma marreta, um por um. Segundo o relato de uma agricultora, ela fica uma semana inteira quebrando coco para fazer cinco litros de óleo. Ela também trabalha quebrando coco para vizinhos “a meia”, ou seja, ela quebra o coco para o vizinho e em troca fica com parte das castanhas. Esse tipo de troca é solicitada porque muitos agricultores não querem ter esse trabalho de quebrar o coco, ou por não possuírem tempo.
As castanhas são torradas no forno por cerca de 20 minutos. Em seguida, elas são trituradas até formar uma massa viscosa. Antigamente, esse processo era realizado manualmente no pilão de madeira, geralmente feitos de madeira de cerne, como pau de pequi ou de jacarandá, pois possuem maior durabilidade. Atualmente, a castanha torrada é moída no desintegrador, uma máquina elétrica que, em poucos minutos, realiza o trabalho de um dia todo no pilão. A massa viscosa que sai do desintegrador é misturada com água e fervida no tacho. A melhor época para fazer a feitura do óleo é durante a lua minguante, uma vez que dentro desse período o óleo rende mais. “Se for fora da minguante sobe tudo [o líquido do tacho] e vai tudo embora”. Se for misturada água quente o processo é acelerado, mas normalmente, cada “tachada” da massa fica em torno de 20 a 30 minutos no fogo. Durante esse período, é importante mexer o líquido para a massa não grudar no fundo da panela. Depois desse tempo, a água começa a ferver e as gotículas de gordura emergem e se aglutinam na superfície da massa. Com o acúmulo do óleo, ele vai sendo aos poucos colhido levemente com uma concha.
Etapa do processamento artesanal da macaúba pra produção do óleo. Foto: Marcelo de Podestà
Depois que todo o óleo é coletado, a massa que sobra no tacho é chamada de “massa restolho” e será armazenada em um tambor para posteriormente compor a chamada “torta” dos animais, formando uma ração para galinhas e suínos. Uma nova parte do líquido é colocada no tacho para repetir o processo. Depois de repetidas fervuras do líquido, toda a gordura coletada retorna para o fogo em outra panela onde o óleo será “purificado”. A intenção é retirar o pouco de água que ainda ficou para que assim o óleo não “mofe”, ou seja, evitar a proliferação de fungos no produto.
Conforme a Central do Cerrado, o óleo da amêndoa da macaúba é comparável ao azeite de oliva em textura e possui excelente paladar. Além de ser mais nutritivo e saudável que o óleo de soja.
Segundo relatos de agricultores da Feira Raízes do Campo, antigamente a região de Jaboticatubas se destacava no beneficiamento de produtos oriundos da macaúba: “Eu nasci fazendo isso em casa [sabão de macaúba], na família. O forte aqui [Jaboticatubas] era a macaúba”.
Segundo a Agência de Desenvolvimento da RMBH, o processamento do fruto dessa palmeira já foi uma das principais atividades na cidade, contando com uma fábrica de sabão e usina de beneficiamento do coco construída há mais de meio século, em 1942. “Nessa região todo mundo vivia disso”, “Antigamente tinha tropeiro que buscava o coco [macaúba] com balaio grande em toda a região […] tropa com mais de 10 lotes de burro (1 lote de burro equivale a 10 burros”). Hoje, as instalações da antiga saboaria se encontram abandonadas.
Antes da chegada de óleos industriais em Jaboticatubas a cidade era abastecida pelo óleo do coco macaúba. Contudo, nas comunidades, ainda hoje há famílias que resistem fazendo essa prática de forma artesanal.
O produto é ligado às comunidades tradicionais de agricultores familiares agroextrativistas de Jaboticatubas, Minas Gerais (Berto, Barreiro, Rio Vermelho, Sapé, Espada, Xiru, Buracão).
Segundo os cálculos de um agricultor do município de Jaboticatubas, o processo descrito anteriormente para a obtenção do Óleo de Coco Macaúba rende cinco litros de óleo (gordura) se utilizar 54 litros de gema (informação extraída de De Oliveria, 2014).
O óleo de coco macaúba é utilizado pelas comunidades tradicionais para cozinhar, para compor receitas de bolo e biscoitos, como na receita de um delicioso biscoito de polvilho tradicional de família da comunidade Berto. Além disso, é usado para hidratar pele e cabelo e com fins medicinais, como expectorante e cicatrizante. De forma geral e segundo a organização Cerratinga, o óleo de coco macaúba extravirgem é versátil, podendo ser usado como óleo de mesa em saladas, grelhados e em receitas diversas. Como todo óleo vegetal, seu consumo ajuda a regular o colesterol. É semelhante ao azeite de oliva com relação à textura e possui um excelente sabor, além de ser rico em vitamina A.
O óleo de coco macaúba ainda é uma grande fonte de renda para as famílias tradicionais que querem preservar essa tradição. O produto é comercializado na feira Raízes do Campo, no centro de Jaboticatubas, e a Associação Amanu está tentando viabilizar meios de processamento comunitário.
Referências
DE OLIVEIRA, Luana do Carmo Araújo. Saberes locais associados ao extrativismo da Macaúba na Feira Agroecológica Raízes do Campo e em quintais de Jaboticatubas, Minas Gerais. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2014.
MORCOTE-RIOS, G. & BERNAL, R. Remains of palms (Palmae) at archaeological sites in the New Word: a review. The Botanical Review, New York, v.67, n.3, p.309-350, 2001.
BONDAR, G. Palmeiras do Brasil. São Paulo: Instituto de Botânica, São Paulo, n:2, p. 50-554, 1964.
MOTTA, P. E. F. et al. Ocorrência da macaúba em Minas Gerais: relação com atributos climáticos, pedológicos e vegetacionais, Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v. 37, p. 1023-1031, 2002.
SILVA, J.C. Macaúba: fonte de matéria prima para os setores alimentício, energético e industrial. Viçosa: CEDAF/DEF/UFV, 1994.44p.
Indicação por Ramonn Melo.
Pesquisa e revisão por Marcelo de Podestà e Ligia Meneguello
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